sexta-feira, setembro 24, 2010

Não acredito no Deus que os homens fizeram...


Queria começar esse texto comentando que Saramago* questiona Deus como o conhecemos, mas seria minha maneira hipócrita de omissão. De atribuir a ele responsabilidade e culpa. Livrar-me de algum fogo infernal, de todos os males, amém.

Aprendi desde muito pequeno, entre orações, e algumas músicas – “... minha culpa, minha culpa, minha culpa”, a não duvidar, a temer. Mas a idade do questionamento veio cedo. Não precisei de muito tempo para entender que meus mestres de escola bíblica e pastores não podiam me ensinar nada sobre deuses humanos. Sobre guerras santas, sobre escrituras bíblicas pregando um deus vaidoso e vingativo.

- Abrãao, oferece teu filho, Isaac, em sacrifício, como farei com o meu.
- Pelo teu erro, Eva, darás a luz com dor e serás submissa a teu homem.

Que grandes pecadoras são essas mulheres modernas, esses homens, inventores de facilidades para o que deveria ser eternamente penoso.

Ao darmos à luz, deus, o amaldiçoamos com a natureza humana e o tornamos tão frágil e mortal que nos reconhecemos nele. Podemos chamá-lo de pai, consentir a própria condenação.

Perdoem-me, também aprendi a não discutir religião, a respeitar as escolhas individuais, mas é por essa liberdade de livre escolha que preferi não pregar mais nos púlpitos a fé de meus mestres; professores e pais (minha mãe que se escandaliza agora com o que não a faço compreender).

A minha escolha não me tornou herege, ignorante da complexidade que sou; impossível de qualquer invenção humana capacitada apenas para geração de deuses.

Não Creio no Deus que os homens fizeram, Creio no Deus que fez os homens.


José Saramago (16 de Novembro de 1922 — 18 de Junho de 2010) foi um escritor, argumentista, jornalista, dramaturgo, contista, romancista e poeta português.
Foi galardoado com o Nobel de Literatura de 1998. Também ganhou o Prémio Camões, o mais importante prémio literário da língua portuguesa. Saramago foi considerado o responsável pelo efetivo reconhecimento internacional da prosa em língua portuguesa
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domingo, setembro 05, 2010

A VOZ DO SILÊNCIO*

Pior do que a voz que cala, é um silêncio que fala. Simples, rápido! E quanta força!
Imediatamente me veio à cabeça situações em que o silêncio me disse verdades terríveis, pois você sabe, o silêncio não é dado a amenidades.
Um telefone mudo. Um e-mail que não chega. Um encontro onde nenhum dos dois abre a boca.
Silêncios que falam sobre desinteresse, esquecimento, recusas.
Quantas coisas são ditas na quietude, depois de uma discussão. O perdão não vem, nem um beijo, nem uma gargalhada para acabar com o clima de tensão.
Só ele permanece imutável, o silêncio, a ante-sala do fim.
É mil vezes preferível uma voz que diga coisas que a gente não quer ouvir, pois ao menos as palavras que são ditas indicam uma tentativa de entendimento.
Cordas vocais em funcionamento articulam argumentos, expõem suas queixas, jogam limpo.
Já o silêncio arquiteta planos que não são compartilhados.
Quando nada é dito, nada fica combinado.
Quantas vezes, numa discussão histérica, ouvimos um dos dois gritar: “Diz alguma coisa, mas não fica aí parado me olhando!”
É o silêncio de um, mandando más notícias para o desespero do outro.
É claro que há muitas situações em que o silêncio é bem-vindo.
Para um cara que trabalha com uma britadeira na rua, o silêncio é um bálsamo.
Para a professora de uma creche, o silêncio é um presente.
Para os seguranças de um show de rock, o silêncio é um sonho.
Mesmo no amor, quando a relação é sólida e madura, o silêncio a dois não incomoda, pois é o silêncio da paz.
O único silêncio que perturba, é aquele que fala. E fala alto.
É quando ninguém bate à nossa porta, não há emails na caixa de entrada não há recados na secretária eletrônica e mesmo assim, você entende a mensagem.

*Dizem que o autor não é identificado, mas eu acredito ser da Martha Medeiros, pois já li algo dela nesse sentido!

sexta-feira, setembro 03, 2010

Carta para um amor Presente

Não te negues. Não te negues aos meus dedos, nem te faças improvável ao meu toque. Os meus olhos só admiram a beleza do teu rosto e o meu abraço anseia quebrar-se em ondas sobre ti. O sopro do sussurrar o teu nome atrai os pássaros da saudade pelo que serás para o meu peito. A tua ausência atravessa a noite em cada hora e mantém-me cativo e desperto, sempre alerta e inteiro. Sinto-me a eterna espera, a eterna véspera do teu abraço. E sou teu, mesmo antes de saber-te. Mesmo que nunca me saibas. Sou teu em detalhes mínimos, nas latências, nas grandezas, nos desvarios e indecências. Então, vem... despe o medo, arranca a venda dos olhos da memória. Volta os passos, apaga o tempo. Reinventa o sonho e faz amanhecer o meu olhar.