domingo, agosto 23, 2009

Sou

Sou o que sabe não ser menos vão
Que o vão observador que frente ao mudo
Vidro do espelho segue o mais agudo
Reflexo ou o corpo do irmão.
Sou, tácitos amigos, o que sabe
Que a única vingança ou o perdão
É o esquecimento. Um deus quis dar então
Ao ódio humano essa curiosa chave.
Sou o que, apesar de tão ilustres modos
De errar, não decifrou o labirinto
Singular e plural, árduo e distinto,
Do tempo, que é de um só e é de todos.
Sou o que é ninguém, o que não foi a espada
Na guerra. Um esquecimento, um eco, um nada.
Jorge Luis Borges, in "A Rosa Profunda"

quinta-feira, agosto 20, 2009

Pandemias e utilidades públicas

Não sei como começar a escrever esse "artigo", mas nos últimos dois meses tenho pensado no surto da chamada "Gripe Suína" e do interessante trabalho de utilidade pública que vem sendo prestado pela mesma.
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Definitivamente a H1N1 chegou para mudar os hábitos de limpezas das pessoas, por isso o nome gripe do porco. Ora bolas, percebam que num mundo onde as pessoas não gostam de se limpar, foi inventado uma doença que levassem a todos se lavarem sempre - nem que seja apenas as mãos, também ajudou a elevar o consumo de álcool - ampliando a campanha lei seca, a redução do contato físico com as pessoas (não pode-se abraçar ninguém) e - não poderia faltar essa - a gripe suína é uma forma universal, mas não do Reino de Deus, de homenagearmos o nosso rei da música pop, Michael Jackson.
Mas esperem um pouco, não é apenas a gripe do porco que presta serviços de (re)educação pública, a gripe aviária também ampliou o consumo de carne bovina desde a sua descoberta em 1900, e quando essa já estava no auge do consumo, por volta de 1985, tivemos a doença da vaca louca, a qual incentivou as pessoas a terem um hábito alimentar mais saudável e "light" com o slogan "comam mais frango".
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E para terminar, a ultima pandemia de utilidade pública foi a gripe espanhola.
Vocês podem me perguntar o porque, já que esta foi uma das piores crises da história do século XX, mas dentre estas vítimas estava o então presidente da república brasileira Rodrigues Alves (1919).
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É... bem que os serviços de utilidade pública, quanto ao seu bom funcionamento, nunca são benéficos ao povo, bem que uma delas poderia atingir o senado em cheio, ah e por falar nisso, não comam mais porco, reavaliem o frango e desconfiem das promoções da carne bovina. Na dúvida, comam peixe, mas logo a gripe do peixe chega por aí.

segunda-feira, agosto 10, 2009

A estrada da certeza

Tinha aprendido que o caminho da certeza se fazia sem complacência nem quebra de vontade. Só lhe faltava a noção exata da medida do amor, para lá das roupagens espúrias, das distâncias impostas, da intransponível barreira da reserva cultivada a frio, e por tudo isso ainda tinha pronto o cavalo do medo para fugir sem demora, a entrega total negada como condição de sobrevivência. Ensaiou a fuga uma última vez, a propósito de (quase) nada, mas o caminho desfez-se ante os seus olhos espantados, turvos pelas vagas que lavavam tanto passado inútil. Olhando na noite impossível para um ponto distante em algum lugar ao norte, ainda viu derreter-se o muro que a isolava de si, dissipado em nuvem e logo tornado verde esmeralda, vértice da lua cheia na maré de todas as madrugadas.

quinta-feira, agosto 06, 2009

Pai

Creio que nunca serei 'forte' como gostarias... ensinaste-me a não ter medo das trovoadas... a correr firme para os saltos na ginástica... a sorrir quando a emoção dava um nó nas palavras.
Ensinaste-me que a verdade é o único caminho... que a chuva é uma benção tal como o sol... e o prazer de mergulhar no mar.
Já dei alguns passos atrás, sabes pai... mas a seguir compensei-os com um andar firme e atravessei medos... alguns Adamastores... e outros bem reais.
Ensinaste-me a olhar para os olhos das pessoas quando falam conosco... e o valor de dar o melhor de nós, sempre, em tudo o que fazemos.
Agradeço-te, tanto, tudo o que me ensinaste...
Mas hoje, agora... precisava que me ensinasses como voltar a acreditar nas pessoas. Voltar a confiar. E não sei, mas acho que ninguém vai conseguir me ensinar, pai...